quinta-feira, 28 de abril de 2011

Infelizmente um fato normal

Estava voltando do trabalho quando um menino subiu no ônibus apressado. Com roupa de escola, mostrou a carteirinha de estudante para a cobradora. Enquanto ela liberava a roleta o menino ficava cada vez mais transtornado. Fazia que não com a cabeça, passava as mãos no rosto e revelava timidamente as primeiras lágrimas no canto dos olhos.
Passou como um vulto para os últimos bancos do coletivo. Eu ouvia ao longe os soluços descompassados de uma tristeza mórbida. Chegamos finalmente ao terminal. Enquanto o motorista estacionava o ônibus fiquei na frente do menino atônito. Pensava se deveria oferecer-lhe ajuda e se isso o ajudaria de alguma forma. Até porquê tem horas que o melhor a se fazer é deixar que as lágrimas lavem a alma e levem a tristeza embora.
Antes que pudesse pensar mais um pouco meus pés me levaram pra perto dele e sem hesitar sibilei a pergunta que pareceu abrir uma comporta de desespero:
- Você precisa de ajuda?
Ele acenou que não com a cabeça.
- O que houve? - insisti.
O menino me olhou brevemente e com a voz trêmula disse que havia sido assaltado. Eu não sabia mais o que dizer, mas acho que não contive minha expressão de pêsames. Ele continuou com meia voz embargada:
- Não é nem pelo celular, mas porque ele colocou uma faca na minha barriga. 
Abaixei a cabeça e lembrei da primeira vez que fui assaltada. Também tinha 15 anos, como aparentava o garoto, e chorei tanto quanto ele. Ou mais. Posso dizer que é choro de alívio, por estar vivo, e choro de susto, por quase ter perdido a vida.
Ofereci meu celular para que ele ligasse para seus pais enquanto entrávamos no metrô. Ao terminar me entregou o celular e seguimos a viagem calados. Se aproximava da estação em que eu desceria quando quebrei o silêncio perguntando seu nome.
- Igor - disse ele um pouco mais calmo.
Desejei-lhe sorte, apertei sua mão e me despedi. Ele se mantinha quieto. O metrô parou, abriu as portas e me preparei para descer. Dei um passo para fora e ele pegou meu braço, esperou que eu o olhasse e disse:
- Obrigado!
Assenti e segui meu caminho.

Flávia Freitas Gomes