Rio de Janeiro, 16 de dezembro de 2001.
Senhor Carlos Lira Matos:
Nos dias que se seguiram após o recebimento de sua carta, a qual eu li imersa em minhas lágrimas, pensei incessantemente na decisão tomada por mim quanto à vida indefesa que carrego no meu ventre. Seria ilusão de minha parte prosseguir com a ideia de que, retirando o fruto de uma violência sexual, me absteria das lembranças que me fizeram tomar tal atitude.
A ausência de uma figura paterna e recursos financeiros também me privaram de analisar as consequências ruins que um possível aborto traria a meu corpo. Mulheres mutiladas e histórias de outras que perderam a vida retirando a que estava dentro de si me serviram como exemplo, ao explorar minha consciência um tanto confusa em meio aos fatos que ocorreram comigo, de que o julgamento que havia tomado era errôneo. Contudo, não posso deixar de dizer ao senhor, que tanto me influenciou a mudar de opinião, que infelizmente não tenho como oferecer um futuro digno ao feto que está em meu ventre. Desse modo, prefiro entregá-lo à adoção, onde uma família dará a ele um lar, amor e esperança de dias melhores. Melhor que vê-lo passando por necessidades básicas de vida.
Agradeço pela atenção e incentivo à valorização da vida. Igualmente ao senhor, não sou católica e nem tenho religião. Porém, mesmo sem credo, sei que a vida é mais importante que armas, guerras e resultante choro e dor. E se a violência acarreta essa marcha constante em direção à morte, começo a caminhar contra ela com pequenos passos e uma atitude bem simples: deixando a vida viver.
Atenciosamente,
Sabrija Gerovic
Flávia Freitas Gomes
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